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DA DESTRUIÇÃO DA QUARESMA AO JEJUM DE GÁS: OU COMO IR DE MAL A PIOR
  • Publicado em 25/02/2023
  • Por Diogo Rafael Moreira

O relaxamento dos católicos modernos em tempos de Quaresma não é algo acidental. Ela vem sendo promovido, de cima para baixo, desde os anos 60. Isso se deve, não só ao incentivo de práticas quaresmais ridículas, como se balançar, literalmente, dentro de uma Igreja, ou fazer jejum de gás – como propôs recentemente o jornal do Vaticano, intitulado L’Osservatore Romano. 

Na verdade, o espírito quaresmal foi destruído por uma reforma radical e arrogante, que tinha em vista trazer a legislação e liturgia da Igreja em acordo com a mentalidade moderna, que – como sabemos – é avessa a todo tipo de penitência corporal, a não ser que seja para perder alguns quilos ou sair bem na foto.

Antigamente, era necessário fazer-se quarenta dias de jejum, obrigatório e ininterrupto, com a exceção dos domingos. Paulo VI, porém, em 1966, desprezando uma disciplina que remontava aos tempos das catacumbas, aboliu o jejum quaresmal em sua ironicamente intitulada Constituição Paenitemini (Fazei penitência). Daí para frente, jejum e abstinência tornou-se algo bastante livre e reduzido, dependente de aspectos econômicos e que poderia ser comutado por oração e boas obras. Em outras palavras, o jejum e abstinência quaresmal passou a ser uma recomendação substituível.

De acordo com a disciplina antiga, as orações litúrgicas da Quaresma, contidas no Missal tradicional em latim, além de serem de uma antiguidade impressionante, estando em uso há pelo menos 1500 anos, elas dispõem, sacerdotes e fiéis, a abraçarem com generosidade e heroísmo os rigores e asperezas do jejum e abstinência quaresmais, manifestando arrependimento e dor pelos pecados cometidos e humilde pedido de misericórdia em face dos justos castigos que por eles merecemos.

Essas orações veneráveis pela sua idade e ainda mais pelo seu conteúdo, foram alteradas pelo Grupo de Estudo número 18 da Comissão de Reforma estabelecida em decorrência do Concílio Vaticano II. Isso significa que nos anos 60 não mudaram apenas a língua das orações, como alguns pensam erroneamente até hoje, indo-se do latim ao português, mas mudou-se principalmente o conteúdo das orações, indo-se do catolicismo ao modernismo, ou seja, do culto ao Deus verdadeiro para o culto ao homem moderno.

Foi o próprio Concílio Vaticano II que deu licença a essas alterações, quando – em seu documento sobre a liturgia, chamado Sacrosanctum Concilium, diz o seguinte: “nesta reforma, tanto os textos quanto os ritos devem ser compostos de modo que eles expressem mais claramente as coisas sagradas que eles significam.” Essa frase dá a entender que as orações antigas já não expressam claramente as coisas sagradas que são ditas, logo era preciso retocá-las e enriquecê-las de outros elementos. Retocá-las significava remover das orações palavras e ideias que não agradassem ao homem moderno, enquanto que enriquecê-las significava jogá-las fora e pôr em seu lugar um texto diferente.

Em seu livro Obra de Mãos Humanas, de onde tirei grande parte destas informações, o Reverendo Padre Anthony Cekada resume assim as mudanças que foram feitas nas orações da Quaresma:

Assim, nas tais orações antigas que foram mantidas no Missal novo, os revisores puseram expressões como “obras de penitência” e “ânimo pela penitência” onde outrora aparecia “jejum”. Similarmente, onde as orações uma vez falavam de mortificações heróicas da carne durante a Quaresma, elas ora falam de “moderação” e “comedimento”.

Outra linguagem nas orações tradicionais da Quaresma mencionava o combate espiritual, a perversidade humana, a cólera de Deus contra nossos pecados, os castigos de Sua ira, o castigo temporal e eterno, nossas faltas ocultas, nossa culpa, a satisfação a Deus, o erro, o fardo dos pecados alheios, nossas más ações ou tribulações. Essas orações ou foram suprimidas ou modifi cadas. 

Até mesmo Judas Iscariotes já não merece um pensamento negativo. A oração da Quinta-Feira Santa, que menciona que ele recebeu um castigo de Deus pela sua culpa, foi removida. 

A Quarta-Feira de Cinzas, sem dúvida, é uma baixa estação para aqueles alérgicos à teologia negativa. A Consilium tinha na verdade contemplado aboli-la. A Quarta-Feira de Cinzas ao final foi mantida, mas somente a contragosto, posto que sua observância estava tão enraizada na vida do povo que “seria difícil removê-la sem encontrar outros inconvenientes.”

No entanto, foram feitas mudanças significativas nas orações para a bênção das cinzas. Duas das quatro orações foram suprimidas (a primeira provavelmente porque menciona um anjo). As duas que ficaram são textos alternativos — você pode escolher um deles — e ambos foram modificados. 

Na primeira oração, o pedido por um espírito de compunção pelo pecado foi cortado e substituído por uma conversa inapropriada sobre celebrar o Mistério Pascal. Na segunda oração, a palavra “penitência” foi substituída pelo termo menos exigente “conversão”, e o perdão como um prêmio da penitência desapareceu, juntamente com a humildade, a fragilidade da condição humana e a morte como pena pela nossa culpa.

À luz dessas supressões tomadas em conjunto, torna-se assim bastante fácil entender o que o criador do Missal novo entendia por “teologia negativa”: qualquer linguagem que enfatizasse a perversidade horrível do pecado como o maior mal e suas terríveis consequências para nós neste mundo e no próximo. O homem contemporâneo não quer ouvir tais coisas — e o Missal de Paulo VI se acomoda a ele. (Obra de Mãos Humanas, pp. 292-293.)

Ora, como para o homem moderno o pecado contra Deus não é mais tão grave, nem requer mais tanta penitência, então que tal trocar o jejum da Quaresma – lembra-se que ele pode ser substituído por outras coisas? - por, digamos, um jejum de gás, um desinvestimento em combustíveis fósseis, em sinal de arrependimento dos nossos “pecados ecológicos”? Que tal usar um tempo sagrado para fazer um boicote de viés político contra a Rússia, dando a César o que não é de César e tirando de Deus o que é de Deus?

Enquanto isso, a depravação de nossa sociedade é recebida de braços abertos, como se permitir ou ignorar graves pecados contra os mandamentos divinos, muitos dos quais são de consequências catastróficas para toda a sociedade, fosse um ato de caridade cristã. 

Realmente, esses falsos católicos de nossa época rejeitam o remédio que poderia curá-los e bebem até a última gota o veneno que irá destruí-los. Que vivendo bem esta Quaresma, de maneira tradicional e católica, não enveredemos nós também por este caminho de perdição. Que Deus nos ajude a cumprir com fidelidade este santo propósito.

REFERÊNCIAS: L'Osservatore Romano, Quaresima: un tempo per disinvestire dai fossili. Padre Anthony Cekada, Obra de Mãos Humanas. Controvérsia Católica, A SALVAÇÃO DE JUDAS na visão de Francisco e da Igreja Católica. Novus Ordo Watch, Getting into the Swing of Lent… literally.

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