Você já deve ter ouvido falar dos Adventistas do Sétimo Dia, discípulos de Ellen G. White, a quem eles consideram uma profetiza e por conta da qual entendem que o dia de sábado deve ser observado no lugar do domingo, atribuindo sua inobservância, em nossos dias, principalmente aos católicos, que, nos tempos de Constantino, teriam substituído o sábado pelo domingo.
Como muitas coisas nas obras de Ellen G. White, aqui temos algo historicamente inexato e certamente calunioso aos católicos, posto que essa visão não só não coincide com a realidade dos fatos, mas exagera a importância do sétimo dia para os cristãos, o que revela uma postura claramente judaizante, explicitamente condenada pela Bíblia e pelos primeiros cristãos.
Neste artigo, provarei três teses sobre o Sétimo Dia, a saber, 1.ª Segundo a Bíblia, o Sétimo Dia é no máximo facultativo aos cristãos, de modo que impor sua observância seria uma falta de caridade; 2.ª O Sétimo Dia é coisa de judeus e servos, não de cristãos e livres; 3.ª O Sétimo Dia é um sinal, uma sombra do que havia de vir na plenitude, que era o domingo, o dia do Senhor.
A OBSERVÂNCIA DO SÉTIMO DIA É FACULTATIVA
Primeiramente, como uma consequência de nossa redenção, operada pelo sacrifício de Cristo na Cruz e consumada pela sua Ressurreição, a guarda do sábado deixou de ser obrigatória, podendo cada um agir segundo a sua própria consciência. Essa diferença está bem registrada na Epístola de São Paulo aos Romanos, capítulo 14, versículo 5: Porque um faz diferença entre dia e dia: Outro porém considera iguais todos os dias: Cada um abunde em seu sentido.
Como se vê pelo contexto de todo o capítulo, São Paulo fala dos cristãos vindos do judaísmo, onde uns continuavam a distinguir o sábado dos outros dias e se abstinham de determinadas carnes, enquanto outros – mais versados na religião cristã – não faziam distinção alguma entre os dias e as carnes, bem conscientes de que esses preceitos da Antiga Lei não valem mais para os cristãos, pois foram abolidos por Cristo na Cruz. Ora, o Apóstolo manda que procedam com caridade uns com os outros, dando a entender que é uma falta de caridade censurar os demais por não guardarem o sábado. Ora, não é esta falta de caridade a alma do adventismo? Não são eles que vivem a censurar os que não distinguem o sábado dos outros dias?
A OBSERVÂNCIA DO SÉTIMO DIA É PRÓPRIA DE JUDEUS
Embora houvesse, por um tempo, tolerância com os cristãos que, vindos do judaísmo, continuavam a observar o sábado, não havia semelhante tolerância com os gentios que julgassem essas práticas necessárias à salvação. São Paulo explica no quarto capítulo da Epístola aos Gálatas que não convém a quem chegou ao conhecimento de Cristo retroceder a uma época de servidão e preparação, qual foi o tempo da lei mosaica, observando os dias e festas guardados pelos judeus. Assim diz ele:
1 Digo pois: Que quanto tempo o herdeiro é menino, em nada difere do servo, ainda que seja senhor de tudo. 2 Mas está debaixo dos tutores, e curadores até o tempo determinado por seu pai: 3 Assim também nós quando éramos meninos, servíamos debaixo dos rudimentos do mundo. 4 Mas quando veio o cumprimento do tempo, enviou Deus a seu Filho, feito de mulher, feito sujeito à lei. 5 A fim de remir aqueles que estavam debaixo da lei, para que recebêssemos adoção de filhos. 6 E porque vós sois filhos, mandou Deus aos vossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Pai, Pai. 7 E assim já não é servo, mas filho. E se é filho: Também é herdeiro por Deus. 8 Mas então que certamente não conhecíeis a Deus, servíeis aos que por natureza não são deuses. 9 Porém agora tendo vós conhecido a Deus, ou para melhor dizer, sendo conhecidos de Deus: Como tornais outra vez aos rudimentos fracos, e pobres, aos quais quereis de novo servir? 10 Observais os dias, e os meses, e os tempos, e os anos. 11 Temo-me de vós, não tenha sido talvez baldado o trabalho que tive convosco.
Como é evidente pelo contexto de toda a epístola que os gálatas não queriam retornar ao paganismo, mas antes, sob a influência dos judaizantes, inclinavam-se a introduzir certas observâncias judaicas em seu meio, como o sábado, fica evidente que o Apóstolo considera essa atitude equivalente a ir do estado de filho e herdeiro de Deus ao estado de servo. Não é isso que promovem os adventistas? Afinal, o que eles querem? Eles querem fazer cristãos retrocederem à uma prática judaica caduca, que era própria de servos, isto é, dos judeus, e não dos filhos que Deus adotou para si em Cristo, isto é, os cristãos.
O SÉTIMO DIA É UM SINAL OU SOMBRA DE COISAS FUTURAS
Concorda o Antigo e o Novo Testamento em que o sábado tenha sido estabelecido como um sinal. Contudo, o Antigo Testamento apenas diz que é um sinal, enquanto que o Novo Testamento esclarece que é um sinal semelhante a uma sombra que vem antes e anuncia a chegada do corpo. Vejamos a evidência para isso nas passagens a seguir:
Êxodo 31. 13: Fala aos filhos de Israel, e dize-lhes: Tendo grande cuidado de observar o meu sábado, porque este é o sinal que eu estabeleci entre mim, e vós, e que deve passar depois de vós a vossos filhos; para que vós saibais que eu é que sou o Senhor, que vos santifico.
Colossenses 2, 16: Ninguém pois vos julgue pelo comer, nem pelo beber, nem por causa dos dias de festa, ou das luas novas, ou dos sábados: 17 Que são sombra das coisas vindouras: Mas o corpo é em Cristo.
De acordo com a visão cristã, esse sinal da Aliança entre Deus e a casa de Israel, que também era tempo de descanso e benignidade para com os servos, era apenas uma sombra do que havia de vir, que era Cristo. Essa distinção entre sombra e corpo é por si mesma muito clara: a sombra somente existe em razão do corpo e, no caso da sombra do sábado, ela existe como preparação da plenitude que viria no futuro com Cristo. Como a plenitude certamente não é a observância do sábado, que é a sombra, qual seria esta plenitude?
Basta olhar para o corpo, que é Cristo.
Nosso Senhor Jesus Cristo ressuscitou no Domingo (Mateus 28,1), consumando assim a nossa redenção (Romanos 6, 9; 1Cor 15, 13-15); este mesmo enviou o Espírito Santo aos Apóstolos em um domingo, isto é, exatamente cinquenta dias depois da Páscoa judaica (Atos 2, 1); os cristãos, seus fiéis discípulos, reuniam-se igualmente no domingo para a celebração da Santa Missa, onde o pão partido pelo sacerdote é o próprio Corpo de Cristo (Atos 20, 7; 1Cor 16, 2) e tinham a este dia como o dia do Senhor, como já diz São João no Apocalipse (1, 10) e o confirma a obra contemporânea chamada Didaquê (14,1), a qual expressamente chama de dia do Senhor ao dia em que os cristãos se reuniam para a Missa. Ora, como se sabe, o nosso domingo vem precisamente do latim dies dominicus, não sendo outra coisa que dia dominical, dia do Senhor. Portanto, vamos à Missa e fazemos nossas coletas e boas obras no mesmo dia em que São Paulo, São João e os cristãos o faziam desde o princípio. Com muita satisfação podemos dizer que não retrocedemos, não adotamos o caminho da servidão judaizante dos adventistas.
Além disso, não estamos sós. Assim foi durante toda a história da Igreja, e certamente bem antes e independentemente de Constantino, que em sua legislação a favor do domingo não agiu senão como um bom governante, fazendo que a lei civil reconhecesse o que já era uma prática generalizada entre os seus súditos cristãos. De fato, das pessoas mais insuspeitas, de mártires que ainda no tempo das perseguições derramaram o seu sangue por Cristo ou de autores eclesiásticos antiquíssimos, aprendemos que o cristão não observa o sábado, mas o domingo.
Santo Inácio de Antioquia, Mártir, pelo ano 107 A.D., dirá em sua epístola aos da Igreja de Magnésia:
Não vos deixeis enganar por doutrinas heterodoxas nem por velhas fábulas que são inúteis. Com efeito, se ainda vivemos segundo a lei, admitimos que não recebemos a graça... Aqueles que viviam na antiga ordem de coisas chegaram à nova esperança, e não observam mais o sábado, mas o dia do Senhor, em que a nossa vida ressurgiu por meio dele e de sua morte. (Epístola aos Magnésios 8-9)
O autor da Epístola que muitos autores atribuíam a São Barnabé, datada entre 70 e 132 A.D., confirma a mesma observância da parte dos cristãos. Depois de falar sobre o sentido espiritual e escatológico do sábado, diz o seguinte: “Eis por que celebramos como festa alegre o oitavo dia, no qual Jesus ressuscitou dos mortos”. Ora, o oitavo dia é precisamente o domingo, o dia depois do sétimo.
Assim como já vimos na Didaquê, São Justino Mártir, por volta dos anos 150, também dirá, em sua Primeira Apologia (em algumas edições, número 67), que os cristãos se reúnem para a Missa no domingo, que os pagãos conheciam como o dia do sol.
Tertuliano, no ano 197, em seu célebre Apologeticus, descrevendo as falsas descrições que os pagãos faziam do Deus cristão e do culto que lhe era prestado, confirma mais uma vez a observância do domingo:
Outros, ainda, certamente com mais informação e maior verossimilhança, acreditam que o sol é o nosso deus. Seremos considerados persas, talvez, embora não adoremos o orbe do dia pintado em um pedaço de pano de linho, tendo-se ele em todos os lugares em seu próprio disco. A ideia, sem dúvida, se originou de sermos conhecidos por nos voltarmos para o leste em oração. Mas vós, muitos de vós, também, sob o pretexto de adorar os corpos celestes, movem seus lábios na direção do nascer do sol. Da mesma forma, se dedicarmos o domingo à alegria, por um motivo muito diferente do culto ao Sol, teremos alguma semelhança com aqueles de vós que dedicam o dia de Saturno ao ócio e a luxúria, embora também se afastem das maneiras judaicas, das quais de fato são ignorantes. (Apologeticus 16)
Note-se que Tertuliano identifica o sábado como uma prática judaica, enquanto o domingo é entendido como uma prática cristã.
Creio que bastam estes testemunhos para demonstrar que sempre foi unânime entre os cristãos a observância do domingo, ao passo que o sábado sempre foi visto como uma prática judaica, tolerável durante um certo tempo, mas a cuja observância não se podia obrigar sem pecado contra a caridade cristã, e – depois de Cristo - nem se podia seguir como necessária à salvação sem pecado grave contra a fé cristã.
É assim que os católicos entendem a mudança do sábado para o domingo, não como uma substituição posterior de uma prática cristã, algo que só existe na imaginação dos adventistas, mas como a passagem do Antigo para o Novo Testamento, do sinal para aquilo que ele significa em plenitude, da sombra para o corpo, que é Cristo.
Portanto, a Sagrada Escritura e a história da Igreja mostram que é justa a observância do domingo, dia do Senhor, mais tarde ratificada pelos chefes da Igreja em diversos Concílios e devidamente reconhecida pela legislação civil. Os que pensam diferentemente, querem o retrocesso e o pecado, promovem antes o judaísmo caduco que o cristianismo de verdade.
Quanto à nós, seguiremos firme na fé de Cristo e dos Apóstolos, jamais nos deixando seduzir pelos falsos doutores que desejam nos fazer observar os sábados da Lei que Cristo aboliu com o seu preciosíssimo Sangue.