Fizemos a análise teológica desta Bula de Paulo IV, sua qualificação e vigência na atualidade.
A questão de se um acatólico poder ser "papável" (capaz de se tornar Papa) precede logicamente ao estudo da Bula, por isso nos servirá de preâmbulo para o estudo da Bula em si. Trata-se da sua incursão no Código Canônico de 1917.
Um acatólico é papável? Interroguemos a tradição!
Quem é elegível ao conclave?
“É uma opinião comum que a eleição duma mulher, dum menino, dum demente ou dum não membro da Igreja (não batizado, herege, apóstata, cismático) seria nula por lei divina”.
“São elegíveis todos aqueles que, de dereito divino ou eclesiástico, não estão excluídos. São excluídas as mulheres, os meninos, os dementes, os não batizados, os hereges e os cismáticos” (Raoul Naz: Tratado de direito canônico, Paris 1954, t. 1, p.375, retomado pelo Dicionário de teologia católica, artigo “eleição”).
A opinião segundo a qual um homem herege ocupa a Sede de Pedro pode no entanto ser Papa é rechaçada praticamente pela unanimidade de todos os doutores e teólogos de todas as épocas. “Esta noção é defendida por um só teólogo, entre os 136 antigos e modernos cuja posição temos podido verificar a este respeito. Falamos do canonista francés D. Bouix (que morreu em 1870)” (Arnaldo Xavier da Silveira: ¿La nouvelle messe de Paul VI: Qu’en penser?, p. 246).
Até os protestantes sabem que os conclaves são regidos pelo princípio de catolicidade dos candidatos à tiara. “É elegível todo cristão (até um leigo) macho, católico, não caído em heresia” (Real encyclopädie für protestantische Theologie und Kirche, terceira ediçã, Leipzig 1904, artigo “Papstwahl”).
A clausura de catolicidade que rege o conclave é uma lei de direito divino. Nosso Senhor deu o exemplo: antes de colocar São Pedro como cabeça da Igreja, demandou que ele fizesse sua profissão de fé. Não é senão depois de assegurar-se da ortodoxia do “papável” que Cristo designa-o como pedra fundamental da Igreja. “«E para ti», disse ele, «¿quem sou eu?». Simão Pedro tomou a palavra: «Tu és o Cristo», disse ele «O Filho de Deus vivo!». Então Jesus tomou a palavra a seu tempo e o disse: Bem-aventurado és Simão, filho de Jonás, porque não te revelou isto a carne nem o sangue, senão meu Padre que está nos céus. E eu por minha vez te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. (Mateus XVI, 15-18).
Que a clausura de catolicidade dos candidatos à tiara seja um lei de direito divino já foi colocado pelo jesuíta espanhol Francisco Suárez (1548-1617).